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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Ponto de vista SBI: a proibição do uso de jalecos



O uso de jaleco ou avental fora do local de trabalho está proibido no Estado de São Paulo, medida que vem gerando polêmica entre entidades de classe quanto à sua relevância. Em entrevista com Marcos Antonio Cyrillo, primeiro-tesoureiro da SBI e coordenador das Comissões de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Santa Catarina, do Hospital do Servidor Público Municipal (HSPM) de São Paulo e do Instituto de Gastroenterologia de São Paulo (IGESP), ele comenta e elucida aspectos da nova lei e expõe a opinião da Sociedade quanto à proibição.
Qual o objetivo da nova medida?
Teoricamente, o intuito da lei é que os médicos não transportem bactérias do hospital para a comunidade e nem da comunidade para o hospital. Seria como se estivéssemos diminuindo as chances de transmitir micro-organismos, visando à redução de infecções hospitalares.

Em sua opinião, tal proibição tem fundamento?
Para nós, médicos, tal medida foi criada para causar um impacto popular e não foi embasada em fundamento técnico. Certamente o objetivo do Legislativo ao lançar o projeto foi garantir que seja tomado cuidado maior com relação ao aumento das taxas de infecção, dentro e fora das instituições. Porém, nós, infectologistas responsáveis pelo controle de infecção hospitalar, não vemos dessa forma. Deve haver apenas bom senso. Se o jaleco está sujo, com sangue ou secreção, o médico tem de tirá-lo; se está limpo, é normal que se ande com ele, pois não é um equipamento de proteção, mas uma vestimenta.

O projeto já está regulamentado?
Sim, está. Inclusive, os médicos que forem vistos trajando o jaleco pelas ruas podem receber multa no valor de dez Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (UFESP), ou seja, R$ 174,50. Não se sabe ainda quem aplicará a pena, mas acredito que a Vigilância Sanitária deva encaminhar o nome do médico infrator ao Ministério Público.

Tal medida é baseada em algum estudo?
Não. Pesquisa alguma mostra a ocorrência de surtos de infecção em tal hospital ou comunidade apontando o jaleco como fonte. Cientificamente não há respaldo.

Em outros países há lei parecida?
Não que eu tenha conhecimento, pois caso exista, certamente é algo que não está presente no protocolo americano ou europeu e não é divulgado para o resto do mundo. Há discussões parecidas, por exemplo, na Inglaterra, em que se debate o uso da gravata. Entretanto, estive em uma reunião da Organização Mundial de Saúde recentemente e nada se comentou acerca do não uso do jaleco nas ruas para controle de infecção.

Foi publicado um estudo que diz que um jaleco não lavado constantemente e um limpo com oito horas de uso possuem o mesmo número de bactérias. É verdade?
Sim, pois nossa pele descama milhares de vez durante um dia, tendo aproximadamente 10 mil bactérias para cada centímetro quadrado dela. Como, obviamente, entramos em contato com nossa roupa o tempo inteiro, é natural que ela fique lotada de micro-organismos. Porém, não quer dizer que os jalecos sejam causadores de infecções em potencial. Um exemplo que prova tal afirmação: caso uma pessoa empreste uma blusa para o irmão ou irmã que possui um furúnculo em alguma parte do corpo, é muito improvável que tal pessoa seja infectada também. Assim, partimos do mesmo ponto.

Se a lei não tem eficácia científica, por que acha que foi aprovada?
Talvez por necessidades especiais partidárias. Quando uma medida do tipo é imposta, deve haver embasamento em algum estudo ou publicação conceituada, que efetivamente prove que o uso do jaleco fora dos hospitais causaria problemas. A questão é que ninguém apresentou isso à classe médica. É uma lei pontual, aplicada apenas em São Paulo, mas temos de rebatê-la para que seja repensada e também para que não se alastre a todo o Brasil.

Todos os profissionais da saúde estão enquadrados nesta lei?
Sim, todos que, de alguma forma, entram em contato constante com os pacientes, como enfermeiros, médicos, biólogos, biomédicos, fisioterapeutas e fonoaudiólogos.

Quais medidas são adequadas para evitar a transmissão de bactérias?
O mais importante é lavar a mãos sempre após manusear equipamentos hospitalares ou depois de examinar um paciente. Além disso, isolar o doente e garantir que seu quarto esteja sempre limpo; fazer uso de álcool gel; usar óculos, máscaras e aventais descartáveis, entre outras. Com certeza tais medidas são mais importantes do que o jaleco em si. A higienização das mãos é o que consideramos fundamental, tanto em instituições de saúde quanto em casa.

O governo não deveria ouvir as entidades médicas para decisões como esta?
Acredito que entidades como a SBI e a Sociedade Brasileira de Controle de Infecção Hospitalar devam ser consultadas pelos parlamentares antes que leis de grande impacto na prestação de assistência ao paciente sejam regulamentadas. Não faz sentido criar uma lei técnica sem que os próprios técnicos tenham conhecimento.

 Fonte: Infectologia.org.br

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